Recentemente, alguns comentários que fiz em um post meu no facebook renderam repercussão inesperada. Por isso, resolvi trabalhar um pouco mais o assunto, evitando assim, qualquer possibilidade de ambiguidade.
O assunto começou com um comentário que fiz sobre a atitude de John Piper, teólogo e pastor americano no Congresso de Lausanne em 2010:
“Deparei-me agora com uma informação que me deixou profundamente decepcionado. John Piper, pastor e teólogo americano que sempre admirei, teria se recusado a pregar no congresso de Lausanne em 2010, pelo simples fato de uma mulher ter sido convidada para conduzir um estudo bíblico, ocupando, assim, o púlpito da conferência. A mulher em questão é ninguém menos que Ruth Padilla (filha do René Padilla, um dos maiores teólogos latino-americanos), que sequer é pastora, mas apenas teóloga, sendo a única mulher entre os preletores. Piper teria dito que se ela subisse ao púlpito, ele não iria. Os organizadores do congresso disseram então que ele poderia ficar em casa, pois ela iria. Ele, então, teria voltado atrás e aceitado o convite. Quando ela subiu ao púlpito para ministrar o estudo, uma turma contrária de homens (pastores/líderes) se levantou e abandonou o recinto. Fico me indagando o que esses homens teriam feito quando aquela mulher de moral duvidosa invadiu o recinto onde estava Jesus e derramou sobre ele o perfume que lhe havia custado um ano de prostituição. Fico ainda imaginando se eles teriam aceitado o testemunho de Maria Madalena acerca da ressurreição de Jesus. Tudo isso me enoja e revela o quão distantes estamos da mensagem subversiva do Filho de Deus.”
Não sei ao certo as razões que levaram Piper recusar-se a subir ao púlpito. Se foi por ter que dividi-lo com uma mulher (já que ele é contrário à ordenação feminina), ou por causa da teologia que ela defende, e da qual seu pai é um dos maiores representantes (Missão Integral). Por qualquer que tenha sido a razão, nada justifica a deselegância, ainda que transpareça certa coerência. E o pior é que houve reação em cadeia. Outros líderes se viram no direito de fazer o mesmo, boicotando o estudo bíblico que Ruth ministrou. Quando chegou a vez de Piper, ele a corrigiu publicamente, comentando um suposto erro de interpretação que ela teria feito.
Bastou que eu expressasse minha decepção para virem críticas de todos os lados, principalmente da ala mais conservadora dos reformados. Alguns chegaram a pedir que eu me retratasse, pois teria dado um falso testemunho sobre aquele santo homem de Deus.
Se quiser ter a sensação de ter mexido num vespeiro, critique algum baluarte da verdade numa rede social qualquer. Experimente criticar Calvino, Lutero, Spurgeon, ou alguns dos atuais como John Piper, R.C. Sproul ou Augusto Nicodemos. Protestantes que tanto criticaram o dogma da infalibilidade papal, agora o atribuem aos heróis da ortodoxia. Pelo menos os ídolos da veneração católica não fazem bem nem mal, posto que são apenas representações feitas em escultura de homens e mulheres que serviram a Deus em seu próprio tempo. Já os protestantes têm ídolos que, apesar de não terem sido oficialmente canonizados, parecem estar acima do bem e do mal. Alguns ainda vivem. São de carne e osso e não de gesso, e por isso, passíveis de erro e de acerto.
Apesar da dívida que temos com eles, devemos reconhecer que são filhos de seu próprio tempo. Cada qual pintou seu próprio quadro com as tintas que as Escrituras lhes deram. Porém, envolveram a tela numa moldura feita a partir de pressupostos culturais e sociais de sua época. Aliás, isso não depõe contra eles. Pelo contrário: os isenta de muita coisa. Como explicar, por exemplo, o fato de Calvino ter enviado Serveto para a fogueira? Ou o vício de tabagismo de Spurgeon? Ou o fato de Lutero, logo após ter afixado suas teses no castelo de Wittemberg, ter se dirigido a um bar para beber cerveja? Aliás, isso nem de perto poderia se comparar ao seu reconhecido antissemitismo. Não estou aqui fazendo juízo de valores, mas mostrando que eram seres humanos passíveis de erro. Algumas de suas atitudes nem sequer eram consideradas erros à época. Vários deles eram escravagistas, nem por isso sentiram-se culpados. LEIA +
http://www.hermesfernandes.com/2014/01/batisterios-cheios-de-ratos-num-museu.html
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